A bifobia invisível no Brasil

A bifobia invisível no Brasil

A violência psicológica produzida pela heteronormatividade

“Eu não vou ser aceito aqui, eu não vou ser aceito quando chegar lá na minha comunidade, eu não vou ser aceito pelos meus amigos, eu não vou ser aceito pela minha família…”

É com essas palavras que vemos Lucas saindo da edição do BBB 21. Motivo? Porque ele beijou outro homem durante uma das festas do programa.

O primeiro beijo entre dois homens na história do BBB, que conta com 21 edições! E, horas depois, um desses homens decide desistir por não suportar a violência psicológica que é feita incessantemente contra ele. Vários questionamentos sobre a legitimidade de seu sentimento, de sua vontade, de suas “segundas intenções”.

“Será que ele não quer se aproveitar da bandeira LGBT+?”, ”Você tem que se decidir!”, “Você não é suficientemente gay”, “Você tá só querendo aparecer”, etc. São frases tão comuns na vida de pessoas não monossexuais (quando se sente atração sexual apenas por um gênero) que já viram rotina.  A sociedade heteronormativa não aceita, a comunidade LGBT+ não autoriza. E aí?

A saída de Lucas do programa é bastante simbólica, pois a casa funciona como um microssistema representando a realidade do Brasil. As pessoas que não se encontram dentro do padrão monossexual são tidas como “aproveitadoras”, “querendo chamar atenção”, etc.

Seguindo uma lógica de que, por se relacionarem com mais de um gênero, conseguiriam transitar entre os espaços, aproveitando os “benefícios” de ambas as vivências (heterossexuais e homossexuais). E o que acontece na realidade é o afastamento das pessoas não monossexuais, ainda mais, de toda a sociedade

Quando falamos sobre LGBTfobia, acabamos considerando todas as pessoas que não são heterossexuais como se tivessem a mesma experiência. Isso segrega a comunidade, pois cada um busca dar voz a sua própria vivência.

Cada letra da comunidade perpassa diferentes tipos de preconceitos, com diferentes recortes culturais e relacionados a papéis de gênero, classe social, raça… Quando colocamos todas as pautas no mesmo saco de pão, acabamos por mascarar várias questões específicas e importantes, e abrimos espaço para esses “achismos”.

Os bissexuais e todos que se encontram dentro desse “guarda-chuva”, ou seja, os panssexuais, bissexuais, polissexuais, e todas as outras sexualidades que se atraem por mais de um gênero, têm um maior risco de sofrer com violência psicológica e emocional pela população em geral, agravando sua saúde psicossocial, sua autoestima e sua habilidade de construir uma rede de apoio.

A bissexualidade é sentida de maneira diferente por cada um 

A bissexualidade não é algo posto, mas sim um espectro, e bem amplo! Cada pessoa vivencia sua bissexualidade de uma forma diferente. Algumas pessoas têm tendência a se interessar mais por homens, enquanto outras se atraem mais por mulheres, outras por pessoas não binárias, e isso pode mudar ao longo do tempo também, ou se manter fixo.

Não ter algo que seja previsível e constante vai contra o senso comum. A sociedade se organiza pelo que ela entende como base, que não muda, o tal “esperado” (que no caso desse texto é a ideia de que mulheres se relacionam apenas com homens e vice-versa).

Somos ensinados, desde crianças, que quando nos tornamos adultos entraremos dentro desse padrão. Ao chegar nesse patamar, não podemos mudar mais, seremos as mesmas pessoas pelos próximos 40 anos, todos iguais. Será que podemos mesmo habitar a mesma fôrminha por anos e anos assim?

A estrutura que se tem em nossa sociedade ocidental é a de se atrair apenas por um gênero (de preferência o gênero oposto ao seu), e se relacionar apenas de forma hetero. Qualquer outra forma de ser ou existir questiona essa estrutura, e por isso é atacada, reprimida e estranhada, pois foge do “adequado”. Apenas uma ideia que ameace o “status quo” precisa ser afastada o mais rápido possível!

Torna-se uma obrigação, você só será aceito e estará seguro se seguir esse padrão. Esse movimento é chamado de monossexismo.

As implicações do monossexismo para a comunidade bissexual são as diferentes violências psicológicas e emocionais que surgem tanto dentro quanto fora da comunidade LGBT+, a vergonha de se assumir como bissexual, medo de procurar assistência médica e precisar relatar suas vivências, entre tantas outros formas de violência sutil. De uma forma velada, as pessoas bi vão se calando, se afastando, se culpando por serem quem são, e é assim que vai se construindo esse movimento de invisibilização.  

O fenômeno da invisibilização

A invisibilização da comunidade bissexual não é só mais um tópico trending no Twitter. Em 1990, o Manifesto Bissexual foi produzido, mostrando todo o desconforto da comunidade de estar sempre nessa posição de questionamento, de análise, de reafirmação constante tanto por pessoas dentro da comunidade LGBT quanto o resto da sociedade heteronormativa.

Desde a publicação desse manifesto, a bissexualidade tem sido compreendida como aquele termo guarda-chuva que falei ali em cima. Isto é, um termo que consegue englobar todas as formas de atração a mais de um gênero, abrindo espaço para outras sexualidades tomarem forma. Libertando das amarras que o monossexismo impõe. 

Segundo o Relatório sobre Bissexualidade, pessoas que se autodeclaram bissexuais acabam tendo maiores níveis de estresse e de transtornos mentais, quando comparados à heterossexuais, gays ou lésbicas.

Isso se deve a diferentes fatores já mencionados, como estereótipos negativos que são postos como verdade para todas as pessoas bi, medo ou vergonha de se assumir por ser questionado ou ridicularizado, como forma de se encaixar em um grupo social sem sofrer rejeição

Por isso a psicoterapia é importante, como uma forma de abrir um caminho para a desconstrução dessa opressão velada e revelar o quanto o peso da nossa sociedade tem sobre esses indivíduos. A emancipação e o empoderamento dessa comunidade é um dos caminhos para podermos abrir espaço para que outras identidades diferentes possam ser vistas e respeitadas.

Não precisamos sofrer sozinhos, podemos dar voz às nossas experiências e ressignificar o “ser bissexual” no Brasil!

Referencias:

https://helloclue.com/pt/artigos/lgbt/mitos-e-realidades-sobre-a-bissexualidade

https://www.grupodignidade.org.br/a-bissexualidade-existe-10-fatos-sobre-a-bissexualidade/

https://bloguealternative.wordpress.com/2019/09/03/texto-o-manifesto-bissexual/

https://bisexualresearch.files.wordpress.com/2011/08/the-bisexualityreport.pdf

Luiza Martins Silva Guimaraes
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