O ser humano integral como objeto da intervenção psicossocial 

intervenção psicossocial
O ser humano integral como objeto da intervenção psicossocial 

O aumento do trabalho à distância

A crise sanitária trouxe uma nova realidade laboral para os trabalhadores: o trabalho à distância. Adaptações foram feitas às pressas para dar conta da realidade do confinamento, resultando em um impacto muito grande nas pessoas em teletrabalho e também em suas famílias.  

Para o bem e para o mal, pessoas, famílias e empresas precisaram mudar o fluxo de seus processos internos, gerenciando crises domésticas e renegociando com clientes internos e externos, e com fornecedores, para, em grosso modo, poder lidar com os efeitos positivos e negativos do homeworking (RIBEIRO et al, 2021).

É neste ponto que a intervenção psicossocial aparece para compreender este novo cenário laboral e compreender a pessoa inserida nele. 

A importância da intervenção psicossocial frente ao homeworking

A intervenção psicossocial opera no campo da intersubjetividade ao buscar compreender as relações entre as pessoas neste no novo cenário laboral, e seu impacto na tríade “sujeito-trabalho-saúde” (FACAS, 2013). Isto vai de encontra ao pensamento de Ribeiro, e também de outros autores (2021), que estabeleceu categorias temáticas para compreender os impactos nos teletrabalhadores, ao definir os benefícios e os efeitos negativos que afetavam a saúde mental deles.  

Num outro trabalho, Fonseca e Pérez-Nebra (2012) propõe uma abordagem que diálogo com a de Ribeiro, ao afirmarem que “o campo da saúde mental no trabalho, tendo consciência das relações homem-consigo-mesmo, homem-sociedade, homem natureza”, validarão a ideia de que os benefícios e efeitos na adaptação ao trabalho remoto (RIBEIRO et al, 2021) são resultados das relações que as pessoas estabelecem com seu meio ambiente e seu mundo (FONSECA-Pérez-NEBRA, 2021). 

FACAS (2013) ao definir a tríade sujeito-trabalho-saúde propõe algo similar ao que propuseram Fonseca e Pérez-Nebra (2012), quando propõe o cuidado ao ser humano integral, que se desenvolve simultaneamente em três instâncias existenciais: consigo próprio, com suas relações interpessoais e com seu mundo.  

Esta intersubjetividade já se encontrava nos textos do filósofo alemão Jürgen Habermas (2006), que acaba por antecipar toda esta discussão ao discorrer sobre a importância da subjetividade e da capacidade de autoconsciência para uma autorreflexão, que transcende a própria consciência. Segundo o filósofo (2006), essa dialética do “Eu” com o “outro” opera no âmbito da intersubjetividade do espírito, enquanto opera com o outro, na experiência de ser um outro “Eu” a comunicar-se com esse “outro”. 

Habermas (2006) antecipa toda esta discussão sobre a intervenção psicossocial no âmbito do teletrabalho ao pensar a atuação humana em três níveis, citando Hegel, numa relação ética, que parte do indivíduo, passando por sua família até chegar à atuação no mundo do trabalho, em que o Eu, para Habermas (2006) faz a mediação entre ele e estas instâncias por meio da comunicação.  

Facas (2013) observa a constituição desse Eu e de sua subjetividade na medida em que se constrói na relação com o outro, e em como a cultura e os processos identificadores, ao longo da vida, hão de influenciar o sujeito na construção de sua subjetividade e suas relações, aproximando-se do pensamento de Habermas (2016).

O sofrimento como causa de adoecimento

É neste ponto que Facas (2013) discorre sobre o sofrimento, ligado ao trabalho, e em como a intersubjetividade pode levar ao adoecimento. O sofrimento torna-se adoecimento para ele sob três condições em que a pessoa não é capaz de uma mobilização subjetiva em ao menos uma delas. 

São elas: a inteligência prática, o espaço público de discussão e o reconhecimento, respectivamente um fazer que relaciona com seu estar-no-mundo, as trocas com outros seres humanos e o desenvolvimento pessoal do eu.

É neste ponto que começamos a observar a intervenção psicossocial mais apropriadamente ao observar como o sofrimento patogênico leva ao adoecimento no campo da intersubjetividade, quando a pessoa opera nesses três âmbitos existenciais da tríade sujeito-trabalho-saúde (FACAS, 2013).  

Esta intervenção observa um sujeito universal, pois a pandemia acabou por igualar o mundo no enfrentamento ao SARS-CoV-2 e a COVID-19, e, sobretudo a um sujeito integral, que não pode ser dissociado de seus âmbitos de ação, sendo o seu eu um mediador destas instâncias. 

Trata-se de uma abordagem compreensiva, que busca alinhar as necessidades de uma contemporaneidade quase pós-pandêmica, observando o ser humano e sua atuação humana neste contexto, que o levou ao teletrabalho, como prática recorrente em suas coletividades.

Nessa nova realidade global, caberá à Intervenção Psicossocial usar teorias, técnicas e métodos psicológicos na compreensão desta nova realidade laboral e de seus benefício e efeitos negativos na saúde mental.

A escuta ativa e a ação terapêutica, como instrumentos de trabalho do psicólogo são alocados e se atualizam no contexto dessas intersubjetividades interconectadas.

Referências 

  1. FACAS, Emílio Peres. Protocolo de Avaliação dos Riscos Psicossoais no trabalho – contribuições da psicodâmica do trabalho. IP/UnB, outubro de 2013. 
  2. FONSECA e Pérez-NEBRAS. A epidemiologia do teletrabalhador: impactos do teletrabalho na saúde mental. In: Cadernos de Psicologia Social do Trabalho, 2012, vol. 15, n.2, p. 303-318. 
  3. HABERMAS, Jürgen. Técnica e ciência como “ideologia”. Lisboa: Edições 70, 2006. 
  4. RIBEIRO et al. Saúde mental e teletrabalho: revisão integrativa. In: Revista Saúde e Meio Ambiente – RESMS-UFMS. Três Lagoas, v. 12, n.02, p.127-147, janeiro/ julho, 2021, Ed. Especial, ISSN: 2447-8822.
Rodrigo Augusto Martins Pissarra
Últimos posts por Rodrigo Augusto Martins Pissarra (exibir todos)
Deixe seu comentário aqui
Assine nossa newsletter

Outros posts que você também pode gostar

Assine nossa newsletter

Fique por dentro dos melhores conteúdos sobre bem-estar, saúde e qualidade de vida

Saúde mental, bem-estar e inovação que seu colaborador precisa

Através do nosso programa de saúde mental, as empresas reduzem perdas com afastamento do trabalho por demandas emocionais.