O que nos faz adoecer: a realidade ou os nossos pensamentos?

O que nos faz adoecer: a realidade ou os nossos pensamentos?

Dedico esta postagem a todos aqueles que já pensaram, pelo menos uma vez na vida, em se desligar do cotidiano conturbado da cidade grande, arrumar as malas e se aventurar na vida como um ermitão em meio a um local despovoado, com bastante verde e aparentemente sem problemas, acreditando que dessa forma irá encontrar a “fórmula da felicidade eterna” na simplicidade da vida no campo.

Mas afinal, será que os problemas deixariam de existir diante dessa mudança abrupta de estilo de vida? Será que deixaríamos de sentir as diversas emoções desagradáveis que nos aflige diariamente?

Para encontrarmos possíveis respostas diante destas provocações que foram levantadas, é necessário a compreensão de dois conceitos que compreendemos erroneamente como semelhantes durante o dia-a-dia, mas que na realidade são totalmente diferentes, referindo-se respectivamente ao “fato” e “pensamento”. O que você sabe sobre esses dois conceitos? Você acredita que eles são semelhantes ou diferentes? O que nos faz sofrer são os fatos ou os pensamentos?

 

O que é um fato?

Segundo o dicionário Michaelis, um fato é conceituado como um evento de cuja ocorrência se tem conhecimento ou coisa cuja existência não se põe em dúvida. Diante do significado da palavra, podemos considerar que o fato é algo que aconteceu, acontece ou que temos absoluta certeza de que acontecerá no futuro.

Vamos tentar entender o que acabou de ser dito através de uma sentença que se constitui como algo real para mim: “Eu realizei um atendimento psicológico em meu consultório particular hoje às 11:00 horas da manhã”. A afirmação anterior pode ser considerada como uma verdade, pela enorme quantidade de provas: a biometria para a minha entrada no prédio comercial, a minha imagem captada pelas câmeras de segurança do local e o relato do meu paciente que se encontrava presente em sessão no horário mencionado.

 

O que é pensamento?

O pensamento refere-se ao significado que atribuímos a um determinado evento real, ou seja, a interpretação que a nossa “mente” atribui diante da ocorrência de um fato e que geralmente é visualizada por nós em formato de imagens mentais ou palavras. 

Ressalta-se que o pensamento não se refere apenas a uma ação introspectiva, da qual nos encontramos realizando uma “leitura” do que se passa por nossa cabeça em um determinado momento, sendo que existe um outro componente muito importante: a linguagem. A este componente os diversos pesquisadores apontaram uma forte relação entre o que pensamos e falamos, chegando à conclusão de que nossa fala é uma genuína expressão do conteúdo que se passa em nossa mente. 

Retornando à situação que descrevi anteriormente referente à sessão de psicoterapia que realizei hoje às 11:00 horas da manhã, recordo-me da ocorrência de alguns pensamentos que passaram durante o atendimento, como: “Estamos caminhando bem com os nossos objetivos, acredito que ele (o meu cliente) em breve irá receber alta”, “Eu acho que ele se identificou com a parábola que eu contei” e “Necessito começar o ensino das emoções no próximo atendimento”

 

Existe uma relação entre fato e pensamento?

Agora que chegamos a uma definição entre fato e pensamento, podemos começar a compreender a relação que existe entre estas duas definições. Primeiramente, com relação ao fato, sabemos que este é algo que corresponde à realidade e que se fosse realizado um questionamento para diferentes pessoas, existe uma grande probabilidade de encontrarmos descrições semelhantes em relação a uma determinada situação.

Por exemplo, se apresentarmos um quadro de um pintor famoso e pedirmos para as pessoas realizarem uma descrição do que visualizam na pintura, possivelmente vamos encontrar diversos elementos repetidos nos discursos.

Ao contrário do fato, o pensamento é uma interpretação subjetiva da realidade na qual existe uma pluralidade de significados para um mesmo indivíduo e que não existem respostas certas ou erradas, mas sim, pensamentos adaptados e não adaptados à realidade. Diante disso, se perguntássemos a um grupo de pessoas o que passou pela cabeça de cada uma quando visualizaram a mesma obra de arte, existe uma grande probabilidade de descrições bem distintas uma da outra.

Embora tenha sido realizada uma apresentação de cada um dos conceitos de forma separada, é importante salientar que durante o cotidiano, as duas definições se complementam, como por exemplo, quando estamos conversando com alguém e expressando nossos pensamentos através da fala e o que foi dito torna-se uma realidade para o ouvinte. 

 

Quem é o responsável por nosso sofrimento?

Através do que foi exposto neste texto, finalmente podemos concluir que não é a realidade que nos traz sofrimento, mas sim a maneira como interpretamos ou damos significado para o que aconteceu ou que está acontecendo conosco, ou seja, o grande “vilão” que se encontra por detrás das emoções, reações fisiológicas e ações desagradáveis é o pensamento.

Porém, devemos nos lembrar que o pensamento possui dois lados de uma mesma moeda, visto que caso o que passe pela nossa cabeça se encontre adaptado à realidade, logo a maneira como sentimos e agimos tem consequências opostas ao que foi mencionado anteriormente, como bem-estar e felicidade.

Tomemos como exemplo a situação atual da pandemia do Covid-19, que está trazendo a morte de milhares de pessoas ao redor do mundo e em nosso país, e da qual ainda não temos uma vacina para ficarmos imunes ao vírus, apesar da existência de pesquisas em fase avançada. Você consegue mencionar ao menos uma pessoa do seu círculo social que atualmente sente-se ansiosa diante da situação que nos encontramos atualmente?

Você consegue mencionar um familiar que se encontra triste em decorrência do isolamento social como forma de prevenção da contaminação pelo vírus? 

Como podemos notar, existem significados diferentes que são atribuídos para um conjunto semelhante de situações, e que consequentemente vai afetar o nosso humor de forma negativa ou positiva.

Diante disso, podemos concluir que a fuga da realidade para um local despovoado e com bastante verde não será o responsável por grandes mudanças que almejamos em nossas vidas, visto que os conteúdos que passam por nossas cabeças provavelmente seriam os mesmos. Caso optarmos por uma fuga da realidade, devemos escapar da fuga dos pensamentos que acreditamos ser reais e que acaba trazendo prejuízos pessoais, profissionais, acadêmicos e sociais.

 

Referências Bibliográficas:

BRITES, I.; CASSIA, R. DE. Pensamento e linguagem. Rev. Lusófona de Educação, Lisboa,  n.22, p. 179-184, 2012.   Disponível em <http://www.scielo.mec.pt/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1645-72502012000300011&lng=pt&nrm=iso>. Acesso em: 13/07/2020.

FATO. In: MICHAELIS, Dicionário Online de Português. UOL, 2020. Disponível em: http://michaelis.uol.com.br/busca?id=pAxp. Acesso em: 13/07/2020

GREENBERGER, D.; PADESKY, C.A. A Mente Vencendo o Humor. 2º Edição. Porto Alegre: Artmed, 2017.

Matheus Vinicius de Oliveira
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