A preocupação faz parte da humanidade há séculos, pois é ela que permite prever, planejar e lidar com as adversidades da vida. Quando o Homo Sapiens, nosso amigo pré-histórico, necessitava caçar para sobreviver, ele precisava pensar (preocupar-se) se iria encontrar comida, se seria atacado por um outro animal ou se sairia vivo, por exemplo.
Hoje, no século XXI, nossas preocupações estão voltadas também para a alimentação, mas não somente isto. Há preocupação com o trabalho ou desemprego, com a família, com o trânsito, com as contas, com o clima, e claro, em 2021, com a pandemia também.
O que é preocupação excessiva?
Entendemos então a preocupação como parte de nossas vidas, e que é natural a preocupação com alguma coisa. Mas quando ela se torna excessiva? Uma bússola norteadora para essa resposta é pensar o quanto ela chega a prejudicar sua vida diária. Ela atrapalha no seu sono? Sua alimentação? Seu relacionamento? Você sente palpitações no coração, uma sensação de ansiedade? Se sim, então é aí que vem a ser excessiva.
A preocupação excessiva está estritamente relacionada ao estresse, que acaba aumentando os níveis de hormônios como cortisol, adrenalina e noradrenalina, que acaba potencializando a hipertensão e as arritmias cardíacas.
Existem alguns pensamentos automáticos que geralmente surgem em nossas mentes em momentos de preocupação. Para percebe-los basta prestar atenção em suas palavras, caso começarem com “e se” já há um indicio para preocupar-se. Por exemplo: “E se eu tiver um ataque cardíaco?”, “E se eu ficar ansioso durante a apresentação?”, “E se mudarem a prova para amanhã?”, “E se mudarem a data do evento?”, “E se chover hoje?”, entre tantos outros “e se”.
De forma alguma a intenção é deixar de se prevenir com relação às adversidades. Isso é muito benéfico tanto para a sua saúde física quanto a mental, seja evitando uma rua com assaltos constantes, seja fazendo uma reserva de emergência, ou levando um casaco para o acaso de esfriar. Preocupações deste tipo são úteis e valiosas para a nossa rotina. O que é necessário identificar e evitar, são preocupações que estão fora do nosso controle.
Já diziam os filósofos estoicos: a única coisa que tenho controle é sobre o meu pensamento e minhas ações, nada mais.
Veja, portanto, que preocupações relacionadas a eventos externos, como clima, trânsito, pessoas, entre tantas outras, estão fora do seu controle. Não é possível controlar o clima, ou o trânsito ou a forma de alguém agir e pensar. A única coisa que posso me perguntar é: “Dentro aquilo que está ao meu alcance, existe algo que eu possa fazer? Se sim ótimo, farei algo a respeito. Se não, então não vale a pena gastar o meu precioso tempo preocupando-me com isso.”
Como lidar com a preocupação excessiva
Definido então o que é a preocupação excessiva, o próximo passo é encontrar uma forma de como lidar com ela. É comum encontrarmos conhecidos, familiares e amigos dando conselhos como: “Você tem que pensar de forma positiva”, “Não pense assim”, “Acredite em si mesmo”. Conselhos muito vagos e de pouca valia.
Pensando nisso, o professor e psicólogo Robert Leahy tentou encontrar algumas formas de lidar com esse tipo de preocupação. O que ele fez, foi pensar no caminho inverso da questão “Como não me preocupar”, transformando em “Como eu ensinaria alguém a se preocupar?”.
Faça o seguinte exercício, imagine surgir na sua frente um ser de outro planeta, um extraterrestre, que não sabe nada do nosso mundo. O seu objetivo é ensiná-lo a se preocupar, como você faria isso? Que regras você iria criar? Que dicas daria? Para Leahy, as formas encontradas para ensinar a se preocupar foram:
- Se algo ruim pode acontecer – se você é capaz de simplesmente imaginar – então é sua responsabilidade se preocupar a respeito.
- Não aceite qualquer incerteza – você precisa saber com certeza.
- Trate todos os seus pensamentos negativos como se fossem verdadeiros.
- Qualquer coisa ruim que venha a acontecer é um reflexo de quem você é como pessoa.
- O fracasso é inaceitável.
- Livre-se de qualquer sentimento negativo imediatamente.
- Trate tudo como se fosse uma emergência.
O intuito deste processo é primeiramente reconhecer as crenças centrais relacionadas à preocupação, para que, a partir disso, possa identificá-las em sua vida e tratá-las da melhor forma possível. Com base no exemplo acima, veja o que o Leahy encontrou como solução:
- Qual a vantagem que você espera obter em se preocupar?
- Lide e aceite a incerteza. Pesquisas demonstram que pessoas que se preocupam excessivamente não toleram a incerteza. Existem poucas certezas nessa vida, preocupar-se com as incertezas é um desperdício de tempo e energia.
- Faça a diferença entre pensamento e realidade. Muitas pessoas acreditam que se existe uma mínima possibilidade de algo vir a acontecer eu preciso tornar aquilo como verdade. Avalie a real probabilidade de algo acontecer e novamente se pergunte: O que realmente está no meu alcance?
- Reconheça como sua personalidade contribui para o problema. Por exemplo, pode-se avaliar os prós e contras de pensamentos tão rígidos, como tudo ou nada.
- Avalie suas ideias a respeito do fracasso. Pessoas com preocupação excessiva acreditam que o fracasso é inaceitável. Porém, a história já nos mostrou diversas vezes que foi com os erros, com as quedas que aprendemos a levantar e a evoluir como pessoa.
- Por fim, como você lida com suas emoções? As emoções são temporárias, elas não são você, elas vêm, ficam por pouco tempo e vão embora. Cuidado para não deixar as emoções predominarem a razão.
Essas foram as dicas encontradas por Robert Leahy para lidar com as preocupações excessivas. Avalie e pondere cada uma das ideias relatadas acima e veja o que é útil e benéfico para o seu desenvolvimento pessoal.
Amor fati
Por fim, mas não menos importante, gostaria de deixar uma expressão muito valiosa para a filosofia estoica e para Nietzsche para complementar o artigo, a expressão “Amor fati”.
Trata-se de uma aceitação integral da vida da forma como ela é, pelos seus aspectos lindos e saudáveis, mas também pelos seus aspectos cruéis e dolorosos, amor ao destino.
É o fato de aceitar e amar a vida como ela foi disposta a você, é admitir que apenas temos controle de nossos pensamentos e ações, é admitir que os infortúnios, as calamidades da vida, os pesares, vieram para transmitir algum tipo de aprendizado único e riquíssimo através da experiência.
Referências:
BECK, J. Terapia cognitivo-comportamental: Teoria e prática. 2ª Ed. Porto Alegre: Artmed, 2013.
DINUCCI, Aldo. O Manual de Epicteto. Tradução do texto grego: Aldo Dinucci; Alfredo Julien. Introdução e notas: Aldo Dinucci. São Cristóvão. Universidade Federal de Sergipe, 2012.
LEAHY, R. L. Como lidar com as preocupações. Porto Alegre: Artmed, 2007. NIETZSCHE, Friedrich. A gaia ciência. Trad. de Paulo César Souza. São Paulo: Companhia das Letras, 2001.
NIETZSCHE, Friedrich. Ecce Homo: como alguém se torna o que é. Trad. de Paulo César de Souza. São Paulo: Companhia das Letras, 2008.
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