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Como funciona a psicoterapia de grupo familiar

“Na minha casa todo mundo deveria ir ao psicólogo” – A psicoterapia de grupo familiar

A psicoterapia de grupo familiar foi uma modalidade que tardou a ser desenvolvida, principalmente porque a terapia sempre foi associada a um espaço de absoluta privacidade onde o indivíduo falaria de seus conteúdos inconscientes e de suas dores a um psicólogo.

A possibilidade de estar junto à família ficava relacionada, então, ao desconforto de desabafar frente aos familiares. É claro que essa visão da família enquanto um dano ao processo psicoterapêutico é errônea, no entanto mantém-se resquícios até os dias de hoje. 

A partir de muitos estudos e práticas sobre o tema, a psicoterapia de grupo familiar foi se constituindo como uma importante opção nas modalidades de atendimento, principalmente frente a um grupo familiar bastante adoecido e desgastado. Apesar de menos comum, a psicoterapia de grupo familiar tem se mostrado efetiva e produtiva. O grupo familiar pode se sentir receoso no início, mas ao longo da psicoterapia irá desenvolvendo e reconhecendo também a capacidade de estar confortável dentro do grupo.

Como funciona a psicoterapia de grupo familiar?

A psicoterapia de grupo familiar pode acontecer semanalmente (como a psicoterapia individual), e alguns psicólogos optam por um tempo maior que 50 minutos para que todos tenham a oportunidade de se expressar. A psicoterapia de grupo familiar aborda tanto o conteúdo quanto a relação da família, ou seja, o que eles têm para dizer e como querem dizer. 

Nos conflitos familiares, as palavras têm grande peso. Ficam marcadas, guardadas e ecoam em momentos difíceis. Outras vezes, o que mais marca são as palavras não ditas, palavras de apoio e carinho. Por esse motivo, a comunicação é essencial na psicoterapia de grupo familiar. Muitas vezes o psicólogo trabalhará a comunicação e como ela se dá, apontando momentos de interrupção, momentos em que alguém não foi ouvido, momentos em que não verbalmente ouve um gesto de cuidado, etc.

O primeiro passo — procurar um psicólogo –, já é um passo de confiança de que a família enquanto grupo tem a capacidade para lidar com o que aparecer. Muito além da capacidade de escutar e acolher, a primeira capacidade do grupo será a de estarem juntos e sustentarem o momento de psicoterapia.

Ao longo da psicoterapia é possível ver o que há de mais familiar e conhecido no outro, assim como o que há mais de desconhecido também.

Como saber se minha família deve fazer psicoterapia de grupo familiar?

Não há nenhuma regra ou lista de sintomas para responder. Normalmente, o grupo familiar que chega na psicoterapia já está bastante adoecido, com conflitos e dificuldades de convívio. É como se essa família tivesse dificuldade em diferenciar os aspectos amorosos e agressivos que a constitui. O grupo familiar desgastado precisa retomar a capacidade de confiar um no outro.

Se a família entende que está bem, nada a impede de buscar a psicoterapia também. Estamos acostumados a procurar o psicólogo quando já estamos no limite, assim como quem sente uma dor física e apenas procura um hospital quando já não aguenta mais.

A família não precisa estar conflituosa e nem mesmo adoecida, apenas pode querer trabalhar algo nessa relação. Há uma chance de que existam muitas coisas não ditas entre um grupo familiar e a psicoterapia pode ser uma forma de procurar como dizer.

Atualmente, a maior demanda de atendimento de grupo familiar tem envolvido crianças e adolescentes. A demanda dos pais traz dúvidas sobre como criar os filhos, como seria certo, como seria errado. A psicoterapia de grupo familiar é usual nesses casos porque a criança se torna um porta-voz daquilo que não está bem no grupo todo. Assim, muitas vezes, a psicoterapia de grupo familiar começa a partir da identificação de quem está mais vulnerável e fragilizado nesse grupo.

Quais as dificuldades de estar em psicoterapia de grupo familiar?

As pessoas podem se sentir receosas, desconfortáveis. A psicoterapia é um momento de intimidade e o grupo pode se questionar se tem essa intimidade um com o outro. O fato é que o caminho da psicoterapia possibilita que a família reconheça seu próprio jeito de estar em terapia. 

Uma das dificuldades que podem aparecer é que alguém não sinta que aquele espaço também é dele. Ou também sentir que o psicólogo se dá melhor com tal pessoa, ou que outra pessoa toma o tempo todo para si. Cabe ao psicólogo saber lidar com essas alianças que podem surgir sem perceber, assim como também cabe ao psicólogo que a fala não fique centrada em determinada pessoa.

Muitas dificuldades podem se assemelhar com a dificuldade de estar em uma psicoterapia individual, como por exemplo abordar assuntos difíceis. Outro exemplo seria a dificuldade de estar ali e a vontade de faltar, de “pular” uma semana.

Essas dificuldades são comuns, e podem ser bastante úteis à psicoterapia se forem comunicadas ao psicólogo. Enquanto grupo, cada um da família tem um tempo diferente, e falar sobre isso é um meio para que cada tempo seja respeitado.

Como a psicoterapia de grupo familiar pode ajudar?

A psicoterapia de grupo familiar é um espaço para que a relação se torne mais saudável. São trabalhadas coisas já ditas, coisas não ditas, momentos recentes e histórias do passado.

A família passa a se reconhecer mais enquanto família: entender suas dificuldades e também suas facilidades. A psicoterapia permite um modo de expressão de sentimentos variados, de amor, cuidado, irritação, angústia, etc. A família não precisa — como muitos pensam — tornar-se uma outra família.

O que é colocado em questão é conhecer o seu jeito enquanto grupo e como cada um pode se sentir mais confortável neste.

Uma família é saudável na medida em que confia na capacidade do grupo de lidar com o que aparece. É como se alguém pudesse ficar adoecido e saber que o grupo dá conta de cuidar e lidar. A família é saudável na medida em que é capaz de ser criativa na própria relação.

Uma família não precisa ser perfeita, apenas suficientemente boa de se estar.

Brunna Moreira

Referências

  1. Nichols, M. P., & Schwartz, R. C. (2007). Terapia familiar. Conceitos e métodos (7a ed.) (M. A. V. Veronese, Trad.). Porto Alegre: Artes Médicas (Trabalho original dessa edição publicado em 2006).
  2. Winnicott, D. W. (1993). A Família e o Desenvolvimento Individual. Săo Paulo: Martins Fontes