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Sobrecarga de trabalho das mulheres em tempos de Covid–19

As mulheres brasileiras desempenham múltiplos papéis na sociedade de nossos dias. Batalham para cumprir as exigências do mercado de trabalho; lutam para desempenhar satisfatoriamente as atividades domésticas (aliás, infelizmente, são ainda atribuições insuficientemente compartilhadas com os homens em grande parte das famílias); dedicam-se aos cuidados com dependentes como filhos pequenos e pais idosos e, também, a necessidade de cuidados pessoais como manter-se com corpo e aparência que lhe proporcione satisfação, além de cuidar da alimentação ou praticar atividade física, por exemplo.

Segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), do IBGE, as brasileiras geralmente realizam jornadas elevadas tanto no âmbito doméstico quanto no mercado de trabalho. Assim, costumam trabalhar em média 18 horas semanais a mais do que os homens.

Essa informação nos ajuda a compreender melhor por que tantas mulheres relatam o sentimento de estarem sempre sobrecarregadas e/ou esgotadas física e mentalmente.

Distanciamento social e redução da rede de apoio

A Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou, no dia 11 de março de 2020, pandemia causada pelo coronavírus Sars-cov-2. Desde então, a vida e a rotina das pessoas ao redor do mundo vem sofrendo mudanças significativas. 

A necessidade de distanciamento social, medida que busca reduzir o contato físico e a interação entre as pessoas da comunidade, com o objetivo de minimizar e retardar a transmissão da doença e, assim, evitar a sobrecarga e o colapso do sistema de saúde, teve impacto no cotidiano de todos.

Uma das implicações do distanciamento social foi a redução abrupta e não planejada da rede de apoio de muitas mulheres, o que implica grandes desafios e a sobrecarga de trabalho feminino.

Assim, a rotina está ainda mais intensa para muitas de nós e nos vemos diante do desafio urgente e importantíssimo de refletir sobre a sobrecarga de trabalho das mulheres e encontrar formas de cuidado e de compartilhamento para todas.

Mulheres cuidadoras

Uma das características frequentemente associadas às mulheres em nossa sociedade e cultura é, sem dúvida, o cuidado com os membros da família e demais ao redor. Somos cuidadoras! Também não restam dúvidas de que as demandas pelos cuidados femininos cresceram, e muito, desde o início da pandemia.

Vejamos algumas situações e contextos que nos levam a crer nessa nova condição:

Cuidados com os filhos em idade escolar:

Com a suspensão das atividades escolares, muitas mulheres se viram diante de uma maior demanda de atenção e de cuidado com os filhos pequenos. Isto inclui, frequentemente, a necessidade de acompanhar aulas online e de apoiar atividades pedagógicas.

Além disso, aquelas que contavam com o apoio de pais, sogros ou de outro familiar para compartilhar o cuidado com os filhos pequenos enquanto trabalhavam ou se dedicavam às atividades domésticas, em muitos casos, tiveram que suspender esse contato e visitas a fim de evitar maior exposição aos familiares que fazem parte de grupo de risco.

Cuidados com pais ou familiares idosos:

Também mulheres responsáveis pelos cuidados com pessoas idosas que apresentam algum grau de dependência física e/ou emocional viram-se sobrecarregadas, porque as restrições à circulação de pessoas, inclusive de profissionais da saúde e de cuidadores, e também as visitas de amigos e familiares, trouxe acúmulo de funções relacionadas aos cuidados necessários e ao convívio.

Cuidados domésticos:

Aquelas que contavam com o apoio de profissionais para realizar os afazeres domésticos que incluem os cuidados com limpeza dos ambientes, de roupas e alimentação tiveram que abrir mão deste suporte em alguns casos, ou adotar medidas preventivas excepcionais que também demandam energia e atenção.

Cuidados com a saúde:

Muitas profissões da área da saúde são majoritariamente femininas, como por exemplo a enfermagem, a psicologia, a fisioterapia e a nutrição.

Muitas dessas profissionais ocupam lugares essenciais nas instituições e serviços de saúde e estão na linha de frente de combate à pandemia de Covid-19, e precisam lidar com a sobrecarga adicional de trabalho e também emocional.  

Nesse contexto, mulheres que já estavam sobrecarregas e realizando múltiplas jornadas antes da pandemia se viram ainda mais demandadas e sobrecarregas, especialmente em atividades que se relacionam ao cuidado com o outro.

É importante considerarmos também que esse acréscimo de tarefas e de responsabilidades femininas se deu em um momento em que a rede de apoio e de compartilhamento das mulheres estava fragilizada pela necessidade de maior distanciamento social.

Nesse contexto, a Organização das Nações Unidas – ONU publicou a cartilha Gênero e covid-19 na América Latina e no Caribe: dimensões de gênero na resposta, na qual aborda aspectos e peculiaridades associadas às mulheres nesta crise de Covid-19.

No documento, destaca-se a importância de “promover medidas de políticas que permitam reconhecer, reduzir e redistribuir a sobrecarga de trabalho não remunerado que ocorre nas residências com cuidados de saúde e atendimento a meninas, meninos, pessoas idosas e pessoas com deficiência, e que é absorvido principalmente por mulheres”. 

Algumas dicas para lidar com a sobrecarga

A sobrecarga de trabalho das mulheres é um fenômeno complexo e com múltiplas causas e consequências em nossas vidas e sociedade.

Sendo assim, deve ser identificado e compreendido por indivíduos e por coletividades para que soluções possam ser efetivamente alcançadas.

Também a formulação e a implementação de políticas públicas que permitam uma redistribuição mais justa do trabalho precisam avançar. Abaixo, compartilho algumas dicas para reflexão sobre atitudes do dia a dia que podem ajudar a minimizar o sentimento de sobrecarga:

 

Referências Bibliográficas:

Gênero e Covid-19 na América Latina e no Caribe: dimensões de gênero na resposta – http://www.onumulheres.org.br/wp-content/uploads/2020/03/ONU-MULHERES-COVID19_LAC.pdf

Ishii, F. H.; Ribeiro, C. S. M. de F.; Dedecca, C, S. Gênero e jornada de trabalho: análise das relações entre mercado de trabalho e família. Trab. Educ, saúde. Vol 7. n° 1. Rio de Janeiro. Mar./June, 2009.